sábado, dezembro 28, 2002

Na cela sem ar, bebo vinho e amorteço as dores do corpo no vazio do silêncio.
Febril, danço imagens em movimentos em câmera lenta: costas se curvam, beijos estalam, afagos são feitos num fervo que lembra o que de mim deixei em algum lugar.
Lanhada em meus desejos, nos espaços em que pulsa a carne viva, busco algo que embruteça a sensibilidade no que tem sido um lento suicídio dia após dia.
A noite se instala nas fronteiras do meu corpo onde solitárias vibrações ardem na agonia da espera do alvorecer. Na distância que é me imposta, sou a escuridão das madrugadas de insônia que devora o luar sem deixar que paixões se realizem e se consumam. Cerca-me o abandono de sepulturas em território inimigo enfeitadas girassóis que brotam onde meus sonhos não ousaram germinar.
Lápides sufocam na cama vazia os ecos de gemidos, escondem meus segredos.
Nenhuma palavra é pronunciada no temor de que quebrado o silêncio, os demônios percebam as portas escancaradas e tornem a me molestar.

E, no entanto, há uma festa acontecendo.
Lá onde um tango rasga a noite, batem copos e risos estouram no ar.

É a vida ordinária que chama para com ela brindar.