quinta-feira, agosto 31, 2006

Sombreado azul-marinho, brasas surgem no horizonte.
Um anjo chapado se arrasta por bares do inferno e atravessa o balé de nebulosas em mais uma noite úmida de morte.
Equilibra o sagrado e o profano: na mão esquerda, um copo de vodka; na direita, a solidão.

segunda-feira, agosto 28, 2006

Dos bilhetes, do carinho, dos beijos e abraços guardo tua quase presença como um gosto de sorvete e algodão-doce.
Descalça, cabelos desgrenhados, olheiras fundas, perdida nos abismos do nada que me cerca, volto às noites das línguas enluaradas que abriam espaços reluzentes no céu de nossas bocas. Faz-me esquecer o suicídio lento que é esse aguardar na ante-sala da vida onde só me resta buscar nos escaninhos da memória, pílulas para dormir.
Aqui não combino com nada. Ninguém espera que a menina que finge ser gente grande chore, demonstre tristeza.
E com a vontade de uma desculpa lá vou eu: flores pintadas na ponta dos dedos, sussurros de estrelas e sorrisos de primavera sem encontrar quem me abrigue. Fecho os olhos, abro portas lacradas, arrasto-me por longos corredores, viro cambalhotas pelas paredes, invado quartos escuros e salas proibidas. Procuro o jardim dissimulado no fundo da minha alma, o lugar onde sopram ventos de ternura perdida na infância e onde as chuvas são beijos roubados em noites aquecidas na pele de alguém.
Hoje em dia sou só disfarces. Prefiro calar no íntimo tudo que dói. Enlouqueço de tempos em tempos, sonho com quem não devo, vivo o que é irreal.

quinta-feira, agosto 24, 2006

Cansei das mentiras, da vida de faz-de-conta, da solidão sem estar só, das exatas trezentas e sessenta e cinco máscaras que do baú transbordam minha inutilidade. Nas esquinas das madrugadas defecando solidão, costuro sonhos indecentes em meu corpo insone. Sigo vontades sopradas por meus demônios, deixo-me seduzir, coração embrutecido querendo despertar.

quarta-feira, agosto 23, 2006

Fugaz, te espio.
Ainda tenho o mesmo vício, a mesma fraqueza: cabeça de hidra sufocada e renascida, cadela no cio, exigente e voraz. Acima da névoa amarga, espremida em obsceno repasto, vazia de todas as formas, oca de qualquer paixão, expio, como vulcão invertido que, escondido nas cinzas, carrega o furor de viver.
Corpo fundido em agonia, anjo obscuro da noite, relâmpagos me penetram, dominam, controlam enquanto danço ao zunido de mil chicotadas até adormecer.